Periscópio

9 Julho - 6 Agosto 2016

A exposição apresenta obras de artistas que vêm se debruçando sobre as chamadas novas mídias e suas tangentes a partir de diversas perspectivas e interesses. 

 

A história da arte é permeada por períodos de transição relacionados aos avanços tecnológicos de cada época. Em O conhecimento Secreto, David Hockney apresentou um corpo de habilidades desenvolvidas por artistas a partir da evolução da tecnologia de manipulação do vidro, habilidades que modificaram profundamente a pintura e as técnicas de representação. O vidro, na forma de espelhos e lentes, possibilitou o surgimento das lentes – que, por sua vez, permitiram o aprimoramento de dispositivos como a camera obscura, que já no século XIV introduzia os princípios da câmera fotográfica. 

 

Posteriormente, a pintura impressionista foi impulsionada pelo desenvolvimento do tubo de tinta óleo, do cavalete portátil e de novos tipos de pincéis, que permitiram aos artistas sair do ateliê e experimentar novas técnicas. Naturalmente, se pensarmos na fotografia, no cinema, no rádio, na TV, no vídeo e outras mídias, é inevitável encontrarmos estadios disruptivos similares que apontariam para uma história das técnicas e tecnologias que, amplificando a capacidade sensória e analítica do corpo humano, vem modificando as formas de interpretar e representar o nosso entorno.

 

O corpo de trabalhos e processos apresentados em Periscópio parte da premissa de que estamos atravessando um destes períodos de transição estimulado pelas tecnologias digitais. A história demonstra que estes intervalos raramente se manifestam como rupturas repentinas e bruscas – em geral, são fruto de processos nos quais conhecimentos novos e antigos se mesclam, Neste sentido, nos estudos de arqueologia da mídia estabeleceu-se a ideia de que toda nova mídia se molda como um decalque de alguma ou diversas mídias precedentes, conquistando lentamente a sua autonomia técnica e discursiva. Poderíamos pensar, a grosso modo, que a fotografia renova e expande a pintura, o cinema a fotografia e assim por diante. Também cabe lembrar que novos repertórios técnicos e tecnológicos são uma fração do conhecimento que espelha o espírito de uma época, na qual necessariamente a linguagem – seja ela falada, escrita ou imagética – é parte fundamental do contexto. Vamos sendo alfabetizados culturalmente no percurso da história, assimilando continuamente repertórios que mediam nossa relação no mundo e que decantam com o passo do tempo. Um claro exemplo disso é a grande transformação das formas de ver e representar instaurada pela descoberta da perspectiva por Brunelleschi no século XV – técnica que se manteve hegemônica durante séculos até o aparecimento do cubismo. Este movimento, por sua vez, foi contemporâneo às descobertas da física que embalam a teoria da relatividade.

 

Quando falamos em “novas mídias e suas tangentes” fazemos menção a esta trama complexa onde tempo, espaço e conhecimento se entrelaçam. Nem todos os trabalhos presentes na exposição têm matriz estritamente digital, mas se constroem ou discursam de alguma maneira sob a ótica da crescente digitalização da vida. Da manipulação de bactérias a um engenho que permite controlar uma labareda de fogo com o pensamento, de reconstruções paramétricas do cristo redentor a partir de imagens encontradas na internet à deformação digital de um corpo real, Periscópio traz vídeos, esculturas, instalações e imagens em que ideias como bio arte, hacking, robótica e ferramentas como interatividade, feedback, bases de dados relacionais e algoritmos e tecnologias como impressoras e scanners 3d, cortadoras a laser e sensores, introduzem vocabulários e alimentam novos imaginários. Novas mídias modificam e expandam corpórea, semântica e gramaticalmente a linguagem em todas as suas dimensões. Em analogia ao artefato que expande o campo de visão para além do óbvio, Periscópio aposta em heterotopias a partir das quais possamos especular livremente sobre o passado, presente e futuro da arte.

 

Fernando Velázquez

 

Artistas

Anaisa Franco, Andy Lomas, Andrei Thomaz, Astrovandalistas, Bruno Vianna, Gabriel Menotti, Giselle Beiguelman, Guto Nóbrega, Fábia Karklin, Felipe Julian, Fernando Velázquez, Flora Leite e Maura Grimaldi, Henrique Roscoe, Herbert Baioco, Jaime Lobato, Julio Parente, Leandro Mendes (Vigas), Lucas Bambozzi, Marcio H Mota, Matheus Leston, Mike Pelletier, Nurit Bar-Shai, Ricardo Carioba, Richard Garet, Roberta Carvalho e Simon Fernandes.