África revisitada

6 Novembro 2018 - 12 Janeiro 2019

A África moderna está vivendo a compressão do tempo como nenhum outro continente. Mal completou 50 anos e é apenas um pouco mais velha do que a média de sua população atual. Ao mesmo tempo, ainda não se abriu completamente à industrialização.

 

Nos centros urbanos percebe-se um vigoroso aumento da produção artística em anos recentes. O último continente onde isso vem acontecendo, a África também passou a estar presente na cena artística global, com todas as vantagens e desvantagens que isso acarreta. Artistas africanos se apresentam regularmente nas grandes exposições internacionais, seja na Documenta, em Veneza, e até mesmo nas Bienais da Ásia e América do Sul. Muitos artistas africanos de renome vivem nas metrópoles da Europa e dos Estados Unidos, mas continuam se inspirando em temas de seu continente de origem, embora estejam pouco presentes por lá. 

 

Ao mesmo tempo, foram fundadas diversas bienais na África, entre elas a de Dacar, de Joanesburgo, de Marraquexe, de Bamaco, do Cairo, de Campala, de Luanda, de São Tomé e Príncipe e também Lubumbashi na República do Congo. A essas, somam-se diversos salões de arte contemporânea e feiras de arte que acontecem em quase todos os países mais importantes da região. 

 

Desse modo, a arte contemporânea africana deu as costas a dois preconceitos longamente estabelecidos; de um lado, o estigma do artesanato e da "arte de aeroporto" e, de outro, as referências etnológicas. 

 

Como em toda parte, também na África a arte contemporânea encontra-se em um permanente processo de renovação criativa. Ainda que não possam ser ignorados os efeitos do colonialismo, não deve ser subestimada a importância do intercâmbio artístico verificado na passagem do período colonial ao pós-colonial e, nesse contexto, a reação dos artistas em relação ao período que antecedeu a independência. 

 

Não causará surpresa que um continente com as dimensões da África tenha produzido uma enormidade de arquivos artísticos com raízes em pelo menos três legados: a cultura nativa, o cristianismo e o islamismo, que, como mostra o exemplo da Nigéria, convivem em um espaço bastante reduzido. Os países do Golfo da Guiné abrigam não apenas mil diferentes grupos étnicos e idiomas, como também incluem elementos anglófonos, francófonos, lusófonos, hispânicos e árabes. 

 

Entre o Senegal e a África do Sul, o Sudão e Angola, a identidade africana moderna é marcada por uma diversidade de encontros culturais e interações, por processos de intercâmbio e aculturações. Se, inicialmente, esses processos diziam respeito à Europa e à América, hoje em dia, e acompanhando a globalização, também se estendem a outras partes do mundo. Logo, a arte africana movimenta-se na zona de tensão entre diversos arquivos: tradicionais e modernos, coloniais e pós-coloniais, locais e globais, cosmopolitas e aqueles influenciados pela diáspora. 

 

Em contraste com a arte ocidental, inserida ou até quase engessada, em uma sequência estrita de tendências estilísticas, a arte contemporânea africana tem a vantagem de não precisar atender a nenhum cânone e poder orientar-se unicamente pelo aqui e agora. Para tanto, lança mão dos materiais disponíveis a cada momento, permeando todos os meios da arte. 

 

Alfons Hug

 

As obras expostas fizeram parte da mostra Ex Africa no CCBB.